As Armas Bacteriológicas como Ameaça à Ordem Mundial: Histórico, Riscos e Efeitos

Introdução

O mundo atual convive com uma constante preocupação com a segurança. Isso ocorre em virtude da violência crescente e também, das ameaças decorrentes dos conflitos de interesse e ainda, pela ameaça terrorista. 

 Aos nos voltarmos a esta última ameaça, é possível afirmar que o terrorismo vem crescendo e se modernizando, inculcando nas mentes dos inimigos sensações de insegurança e vulnerabilidade.

São muitas as ações planejadas e promovidas por ações terroristas, entre elas a ameaça bacteriológica, uma modalidade de ataque capaz de atingir silenciosamente os inimigos, e em certos casos, com letalidade quase total.

Trata-se de uma ameaça silenciosa, porém  de grande potencial destruidor, tendo em vista sua capacidade de levar morte e terror, de modo rápido, imperceptível e nem sempre, combatível.

Pela possibilidade proporcionada pelos custos (geralmente mais baixos que outros tipos de armas de destruição em massa) e letalidade, tal modalidade de arma torna-se interessante a grupos terroristas que vêem nelas a possibilidade de atingirem seus objetivos de forma mais contundente.

Desta forma, aumenta a preocupação com o uso de tal armamento no futuro, e assim, a sensação de insegurança e pânico, um dos objetivos do terrorismo, já estão sendo atingidos desde já.

Por se tratar de uma ameaça que podem alcançar dimensões mundiais, independente da condição de alvo ou inimigo, o mundo atual, e principalmente, os Estados Unidos, buscam meios de descobrir e conter grupos que podem estar produzindo e armazenando tais materiais, sob a justificativa de manutenção da ordem e segurança internacional.

 Por toda a capacidade de alcance e poder, torna-se interessante, discorrer sobre tal temática e os riscos da ameaça.

As Armas Bacteriológicas: Conceituação e Histórico

 Segundo o Doutor Tadeu Fernandes as armas bacteriológicas são entendidas como: 

O uso deliberado dos microrganismos ou suas toxinas como arma de guerra,com o propósito de causar toxinfecções, danos psicológicos com conseqüente desestruturação dos inimigos. Mesmo sociedades primitivas, como as dos indígenas, empregavam como armas toxinas de anfíbios e o próprio curare. Com o desenvolvimento da microbiologia, identificando e isolando os agentes e seus produtos tóxicos e mais recentemente da biologia molecular, permitindo a manipulação genética dos microrganismos, o problema assumiu uma nova proporção.manipulação genética dos microrganismos, o problema assumiu uma nova proporção.1 
Desta forma, é possível entender que tais armas dependem de manipulação humana para sua produção e disseminação, e ainda,  que podem causar riscos importantes aos indivíduos, de acordo com o material utilizado. Trata-se ainda de uma alternativa bélica mais barata, e também de mais fácil acesso, que outras armas de destruição em massa.

Por estas características, as armas  bacteriológicas compõem uma importante alternativa aos terroristas, e também, a países interessados em provocar ataques estratégicos ao território de seus inimigos, podendo inclusive, driblar mecanismos de defesa nacional.   

Segundo o Relatório da CIA (2006, p.190) “o uso de agentes biológicos pelos terroristas é, portanto, uma tendência – e o leque de opções deve crescer.”
Ainda, segundo o Dr. Tadeu Fernandes, é necessário que haja atenção aos riscos da contaminação por agente bacteriológico:  
É necessário o reconhecimento de uma possível contaminação por agente biológico, que deve ser suspeitada quando surgem casos de uma doença geograficamente incomum, mais de  dois pacientes com uma doença febril inespecífica associada com sepse, pneumonia, falência  respiratória ou exantema ou síndrome botulismo-like com paralisia muscular flácida em pessoas previamente saudáveis, além de doenças comuns em outras faixas etárias..2 
Em relação ao histórico do uso dos agentes bacteriológicos como armas de destruição, é possível afirmar que tal modalidade de guerra data da Idade Média: 
Na Antiguidade e na Idade Média a guerra biológica era praticada através do uso das substâncias tóxicas originárias de organismos vivos. Os Exércitos usavam corpos em decomposição para contaminar o abastecimento de água de uma cidade sitiada, ou atiravam para dentro das muralhas inimigas cadáveres de vítimas de doenças como varíola ou peste bubônica (conhecida na Idade Média como peste negra). O arremesso de corpos sobre as muralhas das cidades sitiadas era realizado com o uso de catapultas, e apresentava também um impacto moral pela visão de um corpo voando sobre a muralha e espatifando-se no pátio interno da fortaleza ou cidade, além do forte odor do corpo em putrefação.3 
Durante a primeira guerra mundial, a Alemanha contaminou com anthrax e melioidose o gado exportado para as forças aliadas. A convenção de Genebra (1925) proibiu o uso das armas biológicas, mas não as pesquisas, produção e posse dessas armas. Entre 1932 e 1945 o Japão criou na Manchúria (região da China que  estava sob domínio japonês) um centro de pesquisas de armas biológicas, utilizando experimentalmente inoculações nos prisioneiros. Foram realizadas experiências com: B. anthracis, N. meningitidis, Shigella sp., V. cholera e Y. pestis. Cidades chinesas eram atacadas pela pulverização das culturas, mas também foram lançadas mais de 15 milhões de pulgas contaminadas com a peste. Na segunda guerra mundial, os nazistas inoculavam nos prisioneiros dos campos de concentração, para testar a eficácia de drogas (sulfas) e vacinas, os seguintes agentes: R. prowazekii, R. mooseri, vírus da hepatite A e agente da malária. Os Estados Unidos fez pesquisas nos campos da Escócia para desenvolver bombas com esporos de anthrax.  
A ex-União Soviética manteve durante os anos 80 e 90, onze laboratórios especializados na pesquisa e produção destes agentes, sendo que em 1979 um acidente liberou acidentalmente esporos de anthrax, afetando o gado e humanos em um raio de até 50 Km de distância. Desenvolveram anthrax 77 pacientes, predominantemente na forma inalatória, dos quais 66 faleceram. Empregando técnicas moleculares a Ex- União Soviética desenvolveu 
cepas mais estáveis e virulentas do vírus da varíola para emprego em mísseis balísticos intercontinentais. Foi isolado o gene que produz a toxina do Bacillus anthracis e implantado em outra bactérias deste gênero, tornando assim a vacina ineficaz. Foram desenvolvidas técnicas para dispersar o bacilo da peste, eliminando a dependência das pulgas. Realizaram estudos para implantar o gene produtor de toxina botulínica em outras bactérias. Também, por engenharia genética, foi criada uma cepa da bactéria da tularemia resistente à proteção vacinal e aos antibióticos empregados em seu tratamento. 
É possível perceber que tal ameaça não  é nova, porém tem ganhado sofisticação ao longo dos tempos. 
Atualmente a guerra bacteriológica é manifestada através da manipulação em laboratório de bactérias (ou suas toxinas), vírus e fungos.   
Tais armas foram inicialmente desenvolvidas por países industrializados, principalmente Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, ex-União Soviética, Alemanha, Japão e Canadá. 
Cabe ressaltar que, durante a Guerra  Fria, tanto os EUA quanto a ex-URSS intensificaram pesquisas voltadas a esta modalidade de arma.  
As ameaças provocadas pelas armas bacteriológicas acabaram por resultar numa Convenção voltada ao tema:  
Em 1975, 158 nações assinaram e 140 ratificaram uma convenção sobre armas biológicas que proíbe o desenvolvimento, posse e armazenamento de materiais biológicos para propósitos hostis e conflitos armados. Veta também o desenvolvimento de sistemas de contaminação e a transferência de tecnologia.4 
Entretanto, tal Convenção não previu a existência de um organismo fiscalizador, cabendo ao Conselho de Segurança da ONU a avaliação das denúncias, sendo que as inspeções podem ser vetadas por pedido de um de seus membros.  
 Na prática, o que se pôde observar foi que a Convenção proibiu o “desenvolvimento, a produção e o armazenamento de armas biológicas e toxinas”5, embora autorizando o desenvolvimento, produção e armazenamento de agentes biológicos patogênicos em quantidades limitadas, desde que relacionadas à produção de meios de defesa, como vacinas, remédios. Há ainda, a permissividade da pesquisa, uma vez que a Convenção não a menciona, além de falhar no controle e verificação. 
 Enfim, a Convenção por si só se esvaziou, não apresentando poderio prático de solucionar o avanço das armas bacteriológicas e suas potenciais ameaças à segurança internacional.    
O Cenário das Armas Bacteriológicas: As Ameaças Hoje e Amanhã 
Ao se pensar no cenário de segurança internacional, o uso de armas bacteriológicas constitui uma preocupação atual e de  grande poder simbólico, pois incomoda significativamente a sociedade, por três motivos: poder de destruição, ameaça terrorista e imprevisibilidade. 
O emprego de doenças como armas é assustador, pois a tecnologia de produção de agentes biológicos com potencial de uso bélico não é difícil para alguns países. O uso desses agentes biológicos pelos terroristas para instalar o medo, causa insegurança coletiva, pânico e caos social.6 
Tal preocupação tem justificativa no cenário atual: um número relativamente grande de países e/ou empresas/laboratórios supostamente mantém estoques de agentes biológicos, para uso médico ou pesquisa científica. O problema está na  linha que divide os interesses científicos daqueles ligados à aplicação militar.  
 Há ainda o risco que tais armas ou ingredientes para tal fabricação, caiam nas mãos de grupos terroristas, que tem nesta modalidade de armamento  uma oportunidade de alcançar maiores resultados em suas ações contra a vida.  
Esta oportunidade se dá pela maior facilidade de acesso a este tipo de arma de destruição, com custos mais acessíveis e resultados letais ou comprometimentos significativos, além da temível certeza de que ninguém se encontra livre de ameaça, em segurança. 
O relatório da CIA (2006, p. 190), traz a seguinte afirmação acerca desta realidade: 
O Bioterrorismo parece particularmente adequado aos pequenos grupos que operam com apoio da inteligência. Na verdade, o laboratório dos bioterroristas poderá ser do tamanho de uma cozinha doméstica e a arma lá fabricada, menor que uma torradeira…7  
É possível então, considerar a hipótese de  uso de armas bacteriológicas como forte ameaça à ordem internacional, inclusive considerando seu aspecto de sutileza e rompimento de fronteiras. 
 Ainda quanto a isso, o referido relatório (p.190) aponta: 
“Como normalmente há uma demora para reconhecer as doenças propagadas, em um ‘cenário de pesadelo’ um atentado  poderia ter sucesso antes mesmo que as autoridades percebam que estão sob ataque.8 
Estamos diante de uma realidade, no mínimo preocupante, tendo em vista seu caráter de propagação e silenciosidade, capaz de atingir uma grande parcela da população mundial de forma rápida e incontrolável. 
A Gripe A: Especulações de uma Pandemia 
A ocorrência da gripe suína, logo em seguida denominada Gripe A, nos primeiros meses do corrente ano, provocada pelo vírus  H1N1, trouxe consigo especulações sobre a presença de uma ameaça bacteriológica, uma pandemia. 
A gripe trouxe consigo desconforto e preocupação, pois as informações sobre suas conseqüências e letalidade, apontaram para a possibilidade de uma pandemia, que veio a se confirmar dois meses depois de seu aparecimento, passando a ser esta a primeira pandemia do novo século. 
Cabe ressaltar que, diante de tal ameaça, o mundo se mobilizou no controle de tal surto, o que representa uma tentativa de conter uma doença, ou ainda, na possibilidade de ameaça biológica, frear as ações humanas de destruição de seus semelhantes, numa prova de loucura e sedes de poder e/ou vingança. Vale ainda, destacar que diante da ameaça iminente, nenhum país se mostrou efetivamente preparado para tal tipo de situação. 
Torna-se necessário assim, voltar atenção à elaboração de ações em biossegurança, organizadas estratégica e tecnicamente para mitigar, fiscalizar e combater possíveis ataques biológicos, capazes de colocar em risco populações pelo mundo, vitimizadas em caso de ataques terroristas ou mesmo acidentes biológicos. 
Este será sempre fardo a carregar: o medo, o temor de um ataque silencioso, porém devastador, a incerteza do amanhã. 
Conclusão 
O aparecimento de doenças com capacidade de romper fronteiras é capaz de suscitar no mundo a preocupação de ameaça biológica. 
 As previsões não são animadoras, pois relatam o avanço do terrorismo e este, por sua vez, tende a fazer uso deste tipo de arma, como ferramenta de alcance e disseminação de terror. 
 Embora imprevisíveis, há que se pensar em  ações de biossegurança, numa tentativa de minimizar estas ações, tais como: proibição  absoluta da realização de trabalhos de modificação genética por laboratórios não submetidos a rigoroso controle e regulamentação internacional, planejamento de ações que envolvam criação de sistemas de alerta, controle de qualidade alimentos, da água, atendimento de emergência, resgate, e ainda, um serviço científico voltado para o conhecimento e combate às catástrofes bacteriológicas.
 

Referências
 
1.  Entrevista com o Dr. Tadeu Fernandes, Dr. Nilton José Fernandes Cavalcanti e Dra. Raquel Muarrek Garcia. www.ccih.med.br/guerra-biologica.html. Acesso em 28.05.2009.
2. Entrevista com o Dr. Tadeu Fernandes, Dr. Nilton José Fernandes Cavalcanti e Dra. Raquel Muarrek Garcia. www.ccih.med.br/guerra-biologica.html. Acesso em 28.05.2009.
3.  www.dihitt.com.br/noticia/sera-que-estamos-vivendo-uma-guerra-biologica. Acesso em 27.05.2009.
4. Entrevista com o Dr. Tadeu Fernandes, Dr. Nilton José Fernandes Cavalcanti e Dra. Raquel Muarrek Garcia. www.ccih.med.br/guerra-biologica.html. Acesso em 28.05.200

5.www.diplo.uol.com.br/2001-11,a109. Acesso em 27.05.2009

6. Entrevista com o Dr. Tadeu Fernandes, Dr. Nilton José Fernandes Cavalcanti e Dra. Raquel Muarrek Garcia. www.ccih.med.br/guerra-biologica.html. Acesso em 28.05.2009

7.O Relatório da CIA: como será o mundo em 2020. São Paulo: Ediouro, 2006.

8. Ibidem

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